Você já deve ter ouvido falar de investimento em Bolsa de Valores, B3, ações, fundos de investimento, trade, mas será que realmente sabe o que esse mercado financeiro envolve?
Em síntese, quando falamos de mercado de bolsa, estamos falando de valores mobiliários, que são assim definidos os títulos e contratos de investimento que geram um retorno financeiro para o investidor.
A Lei nº 6.385/76 prevê o que são considerados valores mobiliários:
Art. 2o São valores mobiliários sujeitos ao regime desta Lei:
I – as ações, debêntures e bônus de subscrição;
II – os cupons, direitos, recibos de subscrição e certificados de desdobramento relativos aos valores mobiliários referidos no inciso II;
III – os certificados de depósito de valores mobiliários;
IV – as cédulas de debêntures;
V – as cotas de fundos de investimento em valores mobiliários ou de clubes de investimento em quaisquer ativos;
VI – as notas comerciais;
VII – os contratos futuros, de opções e outros derivativos, cujos ativos subjacentes sejam valores mobiliários;
VIII – outros contratos derivativos, independentemente dos ativos subjacentes; e
IX – quando ofertados publicamente, quaisquer outros títulos ou contratos de investimento coletivo, que gerem direito de participação, de parceria ou de remuneração, inclusive resultante de prestação de serviços, cujos rendimentos advêm do esforço do empreendedor ou de terceiros.
§ 1o Excluem-se do regime desta Lei:
I – os títulos da dívida pública federal, estadual ou municipal;
II – os títulos cambiais de responsabilidade de instituição financeira, exceto as debêntures.
E por que eu preciso saber o que são valores mobiliários?
Se você pretende tokenizar algum de seus ativos, é imprescindível entender se o seu projeto é ou não valor mobiliário, para entender qual a necessidade regulatória do empreendimento.
Isso porque, valores mobiliários são regulados pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), e dependem de registro ou dispensa de registro junto a esta autarquia para a sua oferta pública.
Por exemplo, se você pretende tokenizar ações de sua empresa, chamamos este procedimento de ICO (Initial Coin Offering). A CVM já se posicionou entendendo que o ICO pode representar operação com valores mobiliários, nos termos do artigo 2º da Lei nº 6.385/76, e dependeria de registro ou dispensa de registro.
A oferta pública deste formato de operação sem a anuência da CVM pode trazer prejuízos ao tokenizador, sejam sanções administrativas, multas ou condenações de indenização por parte de investidores prejudicados.
Destacamos que a CVM emitiu uma Nota alertando o mercado sobre as operações irregulares de ICO, mas ressaltou que nem todas estas operações são consideradas valores mobiliários. É importante contar com uma consultoria especializada para entender melhor se a sua operação é ou não valor mobiliário.
Outra hipótese é a tokenização de contratos futuros de produtos rurais. São considerados contratos futuros aqueles em que se negocia coisas ou fatos futuros por um valor pré-determinado.
Exemplificando: João negocia a compra da safra de jabuticabas de Pedro, que está prevista para o ano seguinte, a um valor de R$ 25,00 por quilograma. O preço da jabuticaba no ano seguinte poderá ser superior ou inferior a R$ 25,00, mas João entende que é razoável adquirir por este valor.
Em mercados de bolsa, é possível comprar papéis de mercados futuros de diversos ativos, como produtos rurais, moedas fiduciárias, índices etc.
A negociação desses contratos futuros ou de opções, independentemente dos ativos subjacentes, são consideradas como derivativos e, portanto, valores mobiliários, previsto no artigo 2º, inciso VIII, da Lei nº 6.385/76. Logo, a tokenização de derivativos também depende de registro ou dispensa de registro perante a CVM.
Também é uma possibilidade tokenizar direitos de participação, parceria ou remuneração por empreendimentos, em uma estrutura próxima de uma securitização. A depender do modelo escolhido para esta finalidade, isto pode se enquadrar no formato de Contrato de Investimento Coletivo (CIC), conforme inciso IX do artigo 2º da Lei nº 6.385/76.
A tokenização imobiliária também merece atenção de consultoria jurídica específica para analisar a estrutura regulatória da oferta pública, para evitar Stop Orders e multas da CVM.
A CVM manifestou seu entendimento sobre o tema no Parecer nº 40/2022, que discute a tokenização sob os olhos da regulação e configuração de valores mobiliários.
O parecer inédito emanado pelo regulador trouxe métricas importantes sobre a opinião técnica de seus membros, informações para players que pretendem desenvolver soluções em tokenização, e maior previsibilidade para o que devemos esperar deste mercado.
Além disso, como os tokenizadores deverão desenvolver suas soluções para proteger seus clientes, investidores e demais envolvidos. Quem pretende se aproximar da CVM, pode participar do Sandbox Regulatório previsto na Resolução CVM nº 29/21.
Em linhas gerais, o mercado de criptoativos e tokenização está cada vez mais maduro, e quem ficar de fora desta nova tendência pode perder o timing.
Rafael Rebola
– Sócio da RVF Advogados
– Especialista em Direito Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas (FGVLAW)
– Especialista em Fusões e Aquisições pela Fundação Getúlio Vargas (FGVLAW).
– Graduado em Direito pela Universidade Católica de Santos.
Atuante no mercado jurídico de criptoativos há 04 anos, assessorando exchanges, tokenizadoras, influencers e educadores deste segmento. Também atuante na área do Direito Empresarial, Startups, Nova Economia, M&A, Financeiro e Tributário há mais de 6 anos, tendo participado de diversas operações de estruturação de empresas embrionárias, fusões e aquisições (M&A), notadamente como consultor de fundos de Venture Capital e Aceleradora de Startups.